Não obstante nunca ter fumado ou
bebido, Luiz Gonzaga foi garoto-propaganda do Fumo DuBom, divulgando a
qualidade do produto, a cultura nordestina e aproveitando para buscar
equilíbrio financeiro em razão do ostracismo ao qual foi relegado devido o
advento de tendências musicais inspiradas em culturas do estrangeiro, como a
Jovem Guarda.
Imagens que se fixaram em minha
mente, nas minhas lembranças, difíceis e impossíveis de serem apagadas, foram
gravadas provavelmente no início da década de setenta do século passado.
Quando de um show promovido pelo Fumo
Dubom em Pombal (PB), na lateral do velho cruzeiro que marca a passagem do
século XVIII para o século XIX, de frente à Igreja do Rosário, meu pai, que era
homem de bom gosto musical, pois era fã incondicional da eterna e sublime arte
de Luiz Gonzaga, tendo “Juazeiro” como canção-identidade, me levou para
assistir um dos momentos marcantes de sua vida.
Quando ele me levantou e me colocou
em seu pescoço, pois muito pequeno era impossível ver o que se passava logo
adiante, devido ao grande número de pessoas que se acotovelava intuindo melhor
lugar para desfrutar das músicas que eram cantadas, cenário indescritível se
descortinou aos meus olhos, com a extraordinária performance do “Rei do Baião”.
Àquele homem, com um imenso chapéu de
couro, abrindo e fechando compassadamente a sanfona, todo encourado, marcou
profundamente para o resto da minha vida.
Entendi a razão por que todo dia meu
pai nos acordava com o rádio em toda altura quando programação dedicada ao “Rei
do Baião” era iniciada. Luiz Gonzaga é eterno, ímpar em despertar a
autenticidade e a identidade do sertanejo, pois cantou em versos
extraordinários, a maioria em parceira com Humberto Teixeira e José Dantas de
Sousa Filho, o sertão em corpo e alma.
Imortalizou a nossa flora, os nossos
passarinhos, as secas inclementes, as parteiras, os frouxos, os valentes, o
chofer de praça, a pobreza do nordeste, os retirantes, enfim, a verdadeira alma
do nordeste, a essência que deve permear todas as práticas pertinentes aos
filhos da terra do sol.
Luiz Gonzaga em sua simplicidade
amava sua terra e seu povo de forma incondicional, pois lhes dedicou
antológicas composições que fazem do seu legado um dos mais importantes e
respeitáveis repositórios da verdadeira nordestinidade.
A importância de Luiz Gonzaga era tão
grande que o fascino despertado fez com que Benito di Paula, grande artista
nacional, dedicasse ao “Rei do Baião” uma das mais belas homenagens prestadas
ao sertanejo do Exú, pois ao invocar a sanfona branca do povo e o chapéu de
couro que lembrava a valentia dos cangaceiros, estava sendo selada a referência
de um gênio a um mito do cancioneiro popular de todos os tempos.
Cabe a nós, nordestinos natos,
intensificar a reverência à memória e á arte do eterno Luiz “Lua” Gonzaga, pois
ameaça inaudita se consubstancia quando há nítida aculturação em prol da ênfase
à deturpação dos nossos valores através do advento de pseudo-defensores da
cultura nordestina que pensam mais em cifras do que em buscar a permanência das
nossas tradições, pois intercalando a barulheira estridente dos instrumentos
eletrônicos com os sons cadenciados dos verdadeiros equipamentos que produzem a
música genuinamente nordestina, invertem a real dimensão das pregações
efetivadas por Luiz “Lua” Gonzaga, o eterno e insubstituível “Rei do Baião”.
(*) José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor-adjunto do
Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Mestre em Desenvolvimento e Meio
Ambiente.
Contatos: Rua Raimundo Guilherme, 117 - Quadra 34 -
Lote 32 - Conjunto Vingt Rosado - Mossoró - RN - CEP: 59.626-630 - Fone:
084-3314-4099. E-mails: romerocardoso@uol.com.br / romero.cardoso@gmail.com.
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